Anúncio da exposição de Telemaco Signorini (1835-1901) in La Repubblica, 2 de outubro de 2009. Trata-se de um detalhe de sua obra-prima “L’alzaia” [o canal da ribanceira], pintada em 1864. Ela mostra o trabalho de cinco homens puxando uma barca pesada de carvão contra a corrente ao longo do rio Arno, perto de Florença.
Dante Alighieri Ferrari não nasceu na Emília-Romanha, mas nasceu ali, vizinho a ela, grudado a ela, sob sua influência, à sombra e à névoa dela – em suma, um romanhês de coração, um emiliano agradecido – basta verificar que no momento mais difícil de sua vida, o exílio, foi nas terras da Emília-Romanha que encontrou abrigo, cuidado e proteção, passando, por exemplo, pela cidade universitária de Bolonha e permanecendo mais tempo em Forli. Mas foi na Romanha que Dante também viu no que sua querida Itália tinha se transformado:
“Ah! Serva Itália, morada das angústias, nau sem piloto em mar tempestuoso, imperial outrora, lupanar agora!” (Purgatório, canto VI)
Já no Inferno, um espírito desgraçado quer saber se há paz ou guerra na Romanha. E Dante, com pesar, escreve:
“Ó alma que sob chama tão forte está reclusa, fica sabendo que a tua Romanha jamais uma hora sequer gozou de paz no coração dos tiranos que a oprimem. Mas não está, agora, em guerra declarada. Ravena continua como há muito sob as garras da águia de Polenta [Guido Novello da Polenta], a qual também sobre Cervia estendeu as asas. A terra outrora mártir e gloriosa – Forli - , que também aos franceses causou enormes danos, definha sob as garras do leão verde [alusão a Sinibaldo Ordelaffi, tirano de Forli]. E tanto o velho quanto o novo mastim de Verruchio, que Montagna liquidaram [Malatesta e Malatestino, pai e filho, cruéis senhores de Rimini, que derrotaram, aprisionaram e assassinaram a Montagna dei Parcitati, chefe gibelino], conservam igual sanha no morder, mau governo fazendo onde ainda se sustentam. As cidades banhadas pelo Lamone e pelo Santerno [cidades de Faenza e Ímola, dominadas na época por Maghinardo Pagani, o qual exibia no escudo um leão azul em campo branco] são governadas pelo “Leão do Ninho Branco”, o qual muda de partido a cada inverno; e aquela outra cidade de que o Savio banha o flanco (Cesena), assim como se ergue entre os montes e planura, também alterna entre opressão e liberdade” (Dante Alighieri in Inferno, canto XXVII. São Paulo: Abril, 1994, tradução de Hernâni Donato)
Guerra, garras, tiranos-cachorros, tiranos-águias, tiranos-leões, muita opressão, pouca liberdade. Nau sem piloto, morada das angústias, não uma só, mas aos borbotões, às toneladas. No exílio de sua amada Florença, em solo Emiliano-Romanhês, Dante transforma a angústia em letra, faz do mar tempestuoso morada e oficina. O martelo deste ferreiro se faz ouvir. Eterno.
Desde que me presenteou com Dante eu vejo o mundo de modo diferente, ou pelo menos, viro-me para sair do mundo dos mortos como Dante. Hoje levantei-me perto do poço. Então, eu sai, almocei sozinha num pequeno restaurante e depois encontrei uma velha amiga do mundo dos vivos. E o dia foi muito lindo.
ResponderExcluirCara Marta, que bom que conseguistes caminhar. Que bom!!
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